segunda-feira, 12 de julho de 2010

O Salto na visao masculina...

Uma das poucas coisas divertidas de que eu me lembro da separação dos meus pais foi ouvir minha mãe, em tom de piada e desabafo, dizer que, depois de 20 anos, finalmente poderia usar sapatos altos de novo. Ela era um pouco mais alta que meu pai e evitava exacerbar a diferença usando saltos. Com o fim do casamento, acabou-se a proibição.

Essa história tem pelo menos 30 anos, mas acho que a dificuldade persiste. Altura ainda é uma questão entre casais. Poucas mulheres têm coragem de se envolver com homens menores do que elas. E há poucos caras com personalidade suficiente para sair na rua abraçado a uma mulher maior do que ele. Claro, milhões de casais que não cabem nessa regra, mas ela existe – e está sendo reforçada pela moda.

Outro dia, entrei no elevador do trabalho e havia nele duas moças muito altas. Uma delas eu sabia que era do meu tamanho, mas tinha se tornado muito maior. A outra, um pouco menor, me olhava olhos nos olhos. Ambas usavam saltos enormes. Eu brinquei com a situação, disse que “aquilo” intimidava os homens e encerramos rindo a brevíssima viagem. Esqueci do assunto.

Ontem, porém, ao entrar numa loja de sapatos, o tema ressurgiu. Vi uma moça alta e magra experimentando um sapato meia pata (com plataforma na parte da frente e salto fino atrás) que me pareceu exagerado. Sem salto, ela teria 1,80. Com salto, ficava imensa. E claramente desengonçada. A moça estava insegura, mas a vendedora incentivava: “Está lindo, querida”. Não estava. Saí da loja pensando se havia um inferno para vendedores que mentem.

Nas lojas, como em muitos lugares, as pessoas são movidas pelo desejo. Mas, de onde vem o desejo das mulheres de ficarem tão altas? Minhas colegas de elevador jamais entrariam na fila das baixinhas. A moça da loja tinha altura suficiente para atrair atenção em qualquer ambiente. E não são casos isolados.

Vejo na rua garotas com botas de plataforma que dão a elas um andar pesado e lento, que deve ser o contrário da impressão sensual que gostariam de passar. São raras as que sabem andar ou dançar com elegância num salto agulha – ou numa plataforma com 12 centímetros. Em geral, trocam 10% a mais na altura por quase 100% da liberdade e da leveza de movimentos. Não me parece uma troca justa, mas é assim que estão fazendo.

Nem toda mulher fica sensual de salto alto. Tem gente que fica só mais alta. Não adianta por salto enorme e andar com os joelhos dobrados. Elegância e sensualidade têm a ver com os movimentos. Gente de aparência rígida não seduz. Mulheres que se mexem com graça ganham pontos.

Quando eu era criança, minhas irmãs, já adolescentes, andavam pela casa de salto alto com um livro equilibrado na cabeça. Eu ria às gargalhadas com aquilo, fazendo com que elas também rissem e derrubassem o livro. Não sei se esse treinamento ainda se aplica, mas possa afirmar, com toda certeza, que as minhas irmãs, depois de adultas, só vestiam salto alto para as festa de casamento.

Do ponto de vista dos homens, acho o sacrifício do salto desnecessário.

Os brasileiros têm uma queda acentuada por mulheres pequenas e jeitosas. Somos um país de estatura média e nossos mitos eróticos estão abaixo disso. Desde sempre. Lembro da Carmem Miranda, Sonia Braga e Ana Paula Arosio. Todas pequenas. Carolina Dieckmann, outra moça linda da televisão, tem 1,60. Daniela Mercury eu já cumprimentei pessoalmente: miúda. Outro dia me disseram que a colombiana Shakira, a cantora mais desejada da América do Sul, tem 1,55. Só. Grande mesmo é Gisele Bündchen, que tem 1,79. Mas é inútil tentar se parecer com ela, não?

O fato é que sucesso no Brasil não depende de tamanho. Claro, um salto agulha alonga as pernas, empina o traseiro e dá, à maioria das mulheres, um ar mais sensual. Mas não precisa ser toda hora. Se uma moça baixinha aparece de salto na noite da festa, o impacto é enorme. Não tem de repetir o truque todo dia. Há o risco de banalizar.

Minha impressão é que cada um de nós tem uma medida de parceiro ou parceira que lhe cai bem. Existe até frase feita para isso: é o meu número. E muitas vezes é mesmo. Quando você abraça, dá um encaixe. Quando dança, tudo combina. Quando deita, fica melhor. Achar bonita uma mulher alta não quer dizer que o seu corpo vá ficar feliz com ela. Olhar é uma coisa, transar pode ser outra, inteiramente diferente.

Lembro de um amigo que teve um caso com uma moça grande, bem maior do que ele, que não é um sujeito pequeno. A moça era linda, mas ele vivia reclamando do encaixe. Para beijar, tinha de virar a cabeça pra cima. Para abraçar, só pela cintura. Na hora do sexo, ele, forte, estava acostumado a mover e manusear a parceira – mas com ela não dava. Era muito volume, muito peso. Ele se sentia miúdo e infantil. O caso acabou. Imagino que a moça foi procurar um cara maior. Que encaixasse.

Mas encaixe não quer dizer, necessariamente, baixinho com baixinha e alto com alto. Prefiro pensar nisso como a química do tamanho dos corpos. Qual é a sua? Seres humanos são flexíveis e as possibilidades de encantamento são infinitas. Importante, eu acho, é que cada um de nós descubra a sua própria elegância. As mulheres altas não precisam se curvar para parecer mais baixas. E as pequenas não deveriam se maltratar para ficarem maiores. Graça não tem tamanho. Sedução é jeito e movimento. Com o passar do tempo, a gente descobre do que gosta e quem gosta da gente. Fato.

(Ivan Martins escreve às quartas-feiras)

http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI153131-15230,00-DESCE+DO+SALTO+GAROTA.html

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