Em São Paulo, a maternidade Santa
Joana publica em seu site informações aos futuros pais. Em um dos textos, há
dicas para mães que querem alisar os cabelos crespos da filhas: “Muitas
crianças nascem com os cabelos crespos ou rebeldes demais. Com a adesão cada
vez maior às técnicas de alisamento, algumas mães recorrem a essas alternativas
para deixarem as crianças mais bonitas.” Isso, você leu “mais bonitas”. E o que
são cabelos “rebeldes demais”? Com a repercussão da história, o hospital
retirou o post do ar.
Em Campinas (SP), policiais da PM
que atuam em bairro nobre cumprem a determinação de abordar “indivíduos em
atitude suspeita, em especial os de cor parda e negra”. A orientação consta de
ordem de serviço assinada pelo comandante do batalhão, e se tornou pública
graças à repórter Thais Nunes, do “Diário de S.Paulo”. O Comando da PM nega
teor racista na determinação, dizendo que apenas descreve suspeitos de furto na
região. Pode ser, mas a reportagem pediu documento semelhante, em que o alvo
das abordagens fossem suspeitos brancos. Não obteve resposta.
No Rio de Janeiro, uma família
vai a uma concessionária da BMW em busca de um carro novo. O casal, pais de
cinco filhos, estão acompanhados do caçula, adotivo e negro. Enquanto
conversavam com o gerente de vendas, o garoto se aproxima do pai, quando é
enxotado pelo funcionário da loja. “Eles pedem dinheiro e incomodam os
clientes”, justifica-se, ignorante da situação. Naturalmente, os futuros
compradores deixaram a loja atônitos, e buscam retratação pública.
Claro que nos três casos tudo não
se passou de “mal-entendido”, como explica representante da concessionária em
e-mail enviado aos pais. Ora, a maternidade também diz que “não foi sua
intenção ofender qualquer pessoa", e o comando da PM paulista reconhece um
"deslize de comunicação" (deixaram escapar o que, aliás, já se sabe).
A lógica do discurso do mal-entendido é a do “deixa disso”, de que só mesmo
sendo muito melindroso para se ofender. “Coisa de complexado, né?”.
Ocorre que não só existe racismo
no Brasil como nos esforçamos em ignorá-lo, tamanha é a força persuasiva da
ideia de que o último país escravocrata do continente possa ser livre de
preconceito racial sem encarar sua herança. Engano persistente desde a origem
do mito fundador nacional, que vinga como solução imaginária para tensões de
uma nação formada de maneira autoritária, de cima para baixo.
Contra esse papinho do
mal-entendido, os pais do menino carioca criaram uma página no
Facebook:“Preconceito racial não é mal-entendido. É crime”. Simples assim.
Fonte:
http://br.noticias.yahoo.com/blogs/michel-blanco/foi-mal-192316299.html
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